BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - A previsão de inflação adotada pelo Congresso na elaboração do Orçamento deste ano vai garantir ao governo Jair Bolsonaro (PL) espaço extra de R$ 1,8 bilhão para gastar em 2022, ano em que o presidente buscará a reeleição.
Os congressistas aprovaram a peça orçamentária com uma correção de 10,18% no teto de gastos, a regra que limita o avanço das despesas à inflação. Essa era a projeção para o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) para 2021. Com isso, o teto de gastos foi fixado em R$ 1,679 trilhão para este ano.
A inflação, porém, acabou ficando em 10,06%, segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Sob essa variação, o limite de despesas seria de R$ 1,677 trilhão.
A diferença exata é de R$ 1,829 bilhão, para todos os Poderes. Apenas o Executivo ficará com um ganho de R$ 1,75 bilhão.
O governo entende que não é obrigado a cortar o excesso do teto de gastos no exercício de 2022.
A interpretação é que a PEC (proposta de emenda à Constituição) dos Precatórios permite que o ajuste seja feito apenas na base de cálculo do limite para o ano seguinte nesse caso, 2023.
"O efeito do IPCA realizado (10,06%) menor que a projeção do IPCA utilizada na elaboração do substitutivo do Ploa [Projeto de Lei Orçamentária Anual] 2022 (10,18%) será refletido somente na elaboração do Ploa 2023", confirmou o Ministério da Economia à reportagem.
Especialistas temem que congressistas encontrem na regra um incentivo para jogar para cima projeções de inflação e, assim, turbinar despesas de interesse de deputados e senadores nos próximos anos.
"Vai ter sempre ter uma incerteza. Chega [Orçamento do] ano que vem, podem superestimar de novo, prever inflação [de 2022] um ponto porcentual a mais e abater esse 0,12 [de diferença no IPCA em 2021]", afirma Marcos Mendes, pesquisador do Insper.
"Criou uma zona cinzenta", diz ele, que foi um dos formuladores do teto em 2016. Mendes é crítico das mudanças feitas pela PEC dos Precatórios, mas reconhece que a interpretação do governo tem sustentação no texto promulgado.
A emenda constitucional afirma que a diferença entre a projeção de inflação e o resultado final será calculada pelo Executivo "para fins de definição da base de cálculo dos respectivos limites do exercício seguinte".
A norma prevê ainda que o Ministério da Economia atualize mês a mês as projeções para o IPCA, até a aprovação do Orçamento. Mas o economista Leonardo Ribeiro, analista do Senado e especialista em contas públicas, diz que nenhum trecho da norma obriga o Congresso a usar o número oficial.
"Vamos criar uma nova contabilidade criativa. A estimativa de inflação vai ser ferramenta para criar margem [de gastos], e a gente está tratando de bilhões. Um 'erro' nessa estimativa de inflação pode ter impacto de bilhões", afirma Ribeiro.
Para ele, a interpretação adotada pela Economia pode fragilizar ainda mais o teto como âncora fiscal, depois de sucessivas mudanças na regra já terem arranhado sua credibilidade.
"O teto fica relacionado a uma inflação estimada pelo Congresso. Pode ter qualquer número aí", diz Ribeiro.
Antes da criação do teto, era comum os congressistas inflarem as previsões de receita no Orçamento para abrir caminho à elevação de despesas sem desrespeitar, no papel, a meta fiscal que resulta da diferença entre gastos e arrecadação.
O problema é que a frustração dessas receitas obrigava o governo a cortar gastos, sob intenso desgaste político. Em seguida, o próprio governo e o Congresso foram criando exceções para despesas, em um processo que minou a credibilidade da meta fiscal.
Mendes entende que a brecha na regra do teto é mais estreita porque a correção ainda está vinculada à inflação, e será necessário justificar as estimativas adotadas.
"Agora, não deixa de ser um espaço de discricionariedade para acomodar R$ 1 bilhão para um lado, R$ 2 bilhões para outro", afirma.
Correção inflada no teto de gastos dará a Bolsonaro R$ 1,8 bi extra para gastar - MSN
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