O “fator Americanas” pode obrigar os bancos a reservar em balanço pelo menos R$ 7 bilhões para cobrir o eventual risco de calote da varejista. De acordo com executivos do mercado financeiro, Bradesco, Santander, Itaú Unibanco, Safra, BTG Pactual e Banco do Brasil são, pela ordem, as instituições com os maiores volumes de empréstimos concedidos à companhia. O valor que cada banco emprestou varia, mas vai de cerca de R$ 5 bilhões, no caso do Bradesco, a R$ 1,3 bilhão, no do BB.
As instituições não informam os valores por respeito ao sigilo bancário. Pela legislação em vigor, elas são obrigadas a reservar uma parte do dinheiro para cobrir o risco de devedores duvidosos, o chamado provisionamento. No caso da Americanas, o valor final vai depender de fatores como se os sócios de referência – Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Beto Sicupira – vão injetar recursos novos na companhia ou se a Americanas vai pedir recuperação judicial. A crise na varejista se arrasta desde a semana passada, depois que veio a público a existência de uma “inconsistência contábil” de R$ 20 bilhões.
Um calote não descapitalizaria os bancos, mas poderia reduzir seus lucros. Para o provisionamento, não é preciso reservar o total da dívida, mas uma parte de acordo com o risco. Considerando um cenário em que os bancos reservariam metade dos empréstimos, o Bradesco teria de separar R$ 2,3 bilhões para cobrir perdas com a Americanas; o Santander, R$ 1,8 bilhão; o Itaú, R$ 1,7 bilhão; o BTG, R$ 950 milhões; e o BB, R$ 650 milhões. Os cálculos são do analista Rafael Frade, do Citi. Procurados, os bancos não comentaram.
O montante, porém, dependerá do desenrolar das negociações entre os bancos e a varejista. Uma recuperação judicial não necessariamente levaria o crédito a ser considerado inadimplente, e haveria uma negociação em torno de descontos. Até aqui, os bancos já deixaram claro que só farão acordo se a Americanas for capitalizada – o que gerou um impasse entre as instituições e os acionistas de referência.
“Se a empresa pedir recuperação judicial e não houver nenhum tipo de capitalização, será o pior cenário”, diz o diretor responsável por entidades financeiras da S&P, Guilherme Machado. “Isso poderia fazer com que os bancos, em um prazo de seis meses, provisionassem 100% das operações.” A Genial Investimentos estimou que, nesse cenário mais negativo, o lucro líquido dos bancos poderia cair de 1,8% (no caso do BB) a 6,9% (no do Bradesco).
Vencimentos
Parte dos bancos credores tem ido à Justiça para garantir a cobrança antecipada das dívidas da Americanas, o que ajudaria a reduzir perdas. O BTG e o BV (ex-Votorantim), por exemplo, alegam ter liquidado operações após a divulgação do fato relevante que informou o rombo de R$ 20 bilhões da varejista. Para se proteger desse movimento, a Americanas obteve na semana passada uma liminar para evitar o bloqueio de recursos.
“Todos os créditos que o Banco BV possuía na referida data (da publicação do fato relevante) com o grupo Americanas foram extintos”, afirmou o BV. Segundo apurou o Estadão/Broadcast, as operações somavam cerca de R$ 400 milhões. O BTG, por sua vez, conseguiu retomar ontem R$ 1,2 bilhão da Americanas – em decisão do desembargador Flávio Marcelo de Azevedo Horta Fernandes, da Justiça do Rio –, e teria saldo de R$ 1,9 bilhão ainda em aberto. O Bradesco recorreu ontem à Justiça para ter o mesmo direito, e a expectativa de especialistas é de que outros bancos credores se movimentem na mesma direção.
Esse maior risco da companhia é percebido pelas agências de classificação de risco. A Fitch, por exemplo, cortou a nota da Americanas para C, enquanto a S&P rebaixou a empresa para D. Na Moody’s, o corte foi para Caa3. Nos três casos, as notas significam um risco de calote alto ou muito alto. Há uma semana, a empresa tinha avaliações melhores do que as do próprio Brasil em algumas agências.
Varejista e bancos negociam saída para dívida bilionária
Como a Americanas agiu para suspender o pagamento dos credores?
Na sexta-feira, a empresa conseguiu na Justiça carioca uma medida de tutela de urgência cautelar que suspende a possibilidade de bloqueio, sequestro ou penhora de bens da empresa. O pedido também adia a obrigação de pagamento de dívidas até que a companhia opte ou não, em um prazo de 30 dias, por uma recuperação judicial. Amparada pela Justiça, a Americanas já não pagou, na segunda-feira, juros remuneratórios da 17.ª emissão de debêntures da empresa.
O que diz a decisão obtida pelo BTG?
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O BTG Pactual conseguiu ontem uma liminar na Justiça do Rio de Janeiro para bloquear cerca de R$ 1,2 bilhão das contas da Americanas. O desembargador Flávio Marcelo de Azevedo Horta Fernandes, do Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ), entendeu a decisão de tutela de urgência cautelar, mas disse que se deve “evitar a utilização do instrumento como meio de fraude a credores”.
Além das ações na Justiça, quais movimentos administrativos a Americanas fez para tirar a empresa da crise?
A varejista anunciou na terça-feira Camille Loyo Faria, como nova CFO (diretora financeira) e DRI (diretora de Relações com Investidores) da empresa. Ela foi a responsável pela renegociação do plano de recuperação da Oi, que tinha dívidas de cerca de R$ 60 bilhões. Um dia antes, a Americanas nomeou o banco Rothschild para negociar as dívidas com os banqueiros e credores internacionais, numa lista que inclui mais de 50 nomes e um débito perto de R$ 2,5 bilhões.
Como fica a situação dos maiores acionistas da empresa?
Os bilionários e investidores de referência, Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira, afirmaram que poderiam injetar R$ 6 bilhões na Americanas. No entanto, o montante foi considerado insuficiente pelos bancos credores, que avaliam que o trio precisaria desembolsar entre R$ 10 bilhões e R$ 15 bilhões para viabilizar uma capitalização que a varejista vai precisar fazer de forma urgente para se salvar. Na prática, esse dinheiro seria investido na forma de oferta de novas ações.
Risco de calote da Americanas pode tirar pelo menos R$ 7 bilhões dos bancos - Estadão
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