A queda do governo Dilma Rousseff (PT), em 2016, marcou uma mudança na estratégia da Petrobras, que passou a vender negócios para empresas privadas, gerando cifras bilionárias para essas companhias, como a PetroRio e a 3R Petroleum. A receita da 3R, por exemplo, subiu 3.5 vezes, indo de R$ 204 milhões para R$ 727 milhões em um ano. O lucro da PetroRio quase triplicou, passando de R$ 450 milhões para R$ 1,3 bilhão também em um ano.
Desde 2016, a Petrobras tem um plano de vendas de negócios considerados não essenciais. A iniciativa faz parte do projeto para reduzir a dívida da companhia. Analistas dizem que há um lado bom, porque a estatal obtém recursos para investir em áreas rentáveis, como o pré-sal. Mas também apontam que faltam investimentos em áreas como refino, o que poderia ajudar a reduzir o preço dos combustíveis no país. A Petrobras diz que investe mais do que desinveste e busca áreas de mais retorno (veja o comentário do Petrobras no fim deste texto).
Quem ganhou com as vendas?
A Petrobras já se desfez de R$ 243 bilhões em bens por meio de cerca de 70 transações. Os principais negócios vendidos foram campos maduros de petróleo, ou seja, locais de exploração com mais de 25 anos com cerca de 70% do estoque já extraído, refinarias e distribuidoras de combustíveis.
A partir da venda dos campos maduros de petróleo, duas empresas tiveram resultados positivos: PetroRio e 3R Petroleum. A Vibra, que é a ex-BR Distribuidora, também mostra bons números.
Veja o resultado de alguns negócios que foram vendidos:
A PetroRio adquiriu 30% do campo de Frade, da Petrobras, em 2021 por cerca de R$ 500 milhões (US$ 100 milhões). No primeiro trimestre deste ano, o local foi responsável por cerca de 57% da receita da companhia, que foi de R$ 1,5 bilhão (US$ 309 milhões), segundo a companhia divulgou em balanço.
No ano passado, o campo foi responsável por cerca de 50% dos R$ 4,4 bilhões de receita, com os 30% comprados da Petrobras representando cerca de R$ 660 milhões.
A 3R Petroleum, outra petroleira privada, comprou os campos do polo de Rio Ventura por cerca de R$ 470 milhões (US$ 94,2 milhões) em 2021. Hoje, os campos são responsáveis por cerca de 16% dos R$ 375 milhões de receita da companhia, ou seja, cerca de R$ 51 milhões.
Além disso, a 3R comprou, em fevereiro deste ano, o Polo Potiguar, da Petrobras, localizado na Bacia Potiguar, no Rio Grande do Norte, por R$ 6,9 bilhões (US$ 1,38 bilhão). Deve entrar em total operação em breve.
Empresas aproveitam plano da Petrobras
"Essas duas empresas nasceram justamente para comprar campos maduros. Já era uma estratégia conhecida, a Petrobras já havia anunciado que ia se desfazer, e as pessoas do setor visualizaram a criação de companhias para ganhar dinheiro", disse Flávio Conde, analista da Levante.
Segundo Sidney Lima, analista da Top Gain, as aquisições de campos maduros pelas companhias fazem com que ambas sejam cortejadas pelos agentes do mercado, com balanços lucrativos.
"Tais movimentos beneficiam ambas quanto à capacidade produtiva, o que consequentemente aumenta receita e se reflete no balanço", disse.
Não à toa, as ações de PetroRio e 3R Petroleum já se valorizaram 33% e 38% neste ano, respectivamente. A maior acionista individual da PetroRio é o fundo Aventti Strategic Partners, enquanto que da 3R é a gestora Starboard.
Outro dos principais ativos vendidos foi a BR, distribuidora de combustíveis, por cerca de R$ 12 bilhões no ano passado.
A companhia, rebatizada de Vibra, tem como principal acionista o fundo Samambaia Master Fundo, controlado pelo investidor e ex-banqueiro Ronaldo Cézar Coelho, já teve lucro de R$ 2,5 bilhões só no ano passado.
Petrobras não poderia ter mantido negócios e lucrado com eles?
Apesar da melhora no balanço da Petrobras com as vendas, há especialistas que veem problemas. Juliane Furno, doutora em economia pela Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) e economista-chefe do IREE (Instituto para Reforma das Relações entre Estado e Empresa), diz que a estatal deixa de lado a função social da companhia.
"Tudo isso é muito ruim para a sociedade. A sociedade quer uma Petrobras que dê e distribua lucro, mas que cumpre a sua função social, que nesse caso é zelar pela segurança energética, que não é só garantir existência física do setor, mas a preços acessíveis. Para isso, a Petrobras deveria reter parte dos lucros gerados para investir, e não desinvestir", disse.
Para Rodrigo Glatt, sócio da gestora GTI, a saída dos ativos fez com que a empresa fizesse um trabalho de realocação de capital, permitindo lucros, mas também o pagamento de dividendos e impostos à União.
"O benefício para a empresa foi excepcional, pois saiu de uma dívida gigantesca e está com um balanço muito saudável, possibilitando que ela pague dividendos estratosféricos. A riqueza e os impostos que a Petrobras gera, ajudando o superávit do governo nos últimos anos, também são muitos bons", afirmou.
Segundo Flávio Conde, analista da Levante, a Petrobras vem lucrando mais com foco apenas nos campos de petróleo que possui atualmente.
"Essas empresas vão ter o mesmo retorno que a Petrobras teria, mas a Petrobras ganha mais com o mesmo dinheiro investindo em campos novos e aumentando a produção do pré-sal. Então é uma otimização do capital", disse.
"A Petrobras vem fazendo desinvestimentos, vendendo distribuidoras e campos mais maduros de petróleo para empresas mais novas, e também tem tentado vender as refinarias. Com isso, a Petrobras ganhou capacidade para investir em projetos mais rentáveis, principalmente no pré-sal, em águas profundas. Por isso temos visto resultados recordes e crescentes desde 2016", disse Glatt.
Bom desempenho da Petrobras após as vendas
Segundo especialistas ouvidos pelo UOL, com o foco no pré-sal, a Petrobras conseguiu reduzir custos e ampliar a produção que, com o aumento nos preços internacionais do petróleo, elevaram o lucro da companhia.
No primeiro trimestre deste ano, a Petrobras teve um lucro líquido de R$ 44,561 bilhões, um desempenho 3.718,4% maior do que no mesmo período do ano passado.
Além disso, a dívida bruta da estatal caiu para R$ 317,7 bilhões, em setembro de 2021, em comparação com R$ 435 bilhões em 2015.
Para Juliane Furno, porém, as vendas fizeram com que a companhia estatal parasse de investir, gerando, inclusive, uma alta no preço dos combustíveis.
"Não há necessidade de tanta rapidez na desalavancagem da empresa. A Petrobras não tem nenhum problema de financiamento, as agências [de classificação de risco] olham não para o tamanho da dívida, mas para as reservas petrolíferas, e isso a Petrobras tem muito. E tem muito porque investiu", disse.
"Só que neste momento o que o Brasil precisa é de investimento, especialmente em capacidade de refino, para que a gente possa reduzir o montante importado de combustíveis e ficar menos reféns de preços internacionais e variações na taxa de câmbio", completou.
Petrobras diz que investe em áreas lucrativas
Procurada, a Petrobras afirmou em nota que "investe mais que desinveste". Segundo a companhia, a estratégia sobre os desinvestimentos "é importante, pois permite que a Petrobras foque seus investimentos nas áreas com maior possibilidade de retorno", informou.
"Isso possibilita mais investimentos e incremento nas receitas para estados e municípios, com impacto positivo sobre a atividade econômica local."
O UOL também procurou as demais empresas citadas, mas elas não quiseram se manifestar.
Empresas que compraram negócios da Petrobras chegam a triplicar lucro - UOL Economia
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