O mundo está sob ameaça de uma recessão -redução da atividade econômica, com desemprego, menos produção e consumo. A possibilidade de essa crise acontecer nas maiores economias do planeta aumentou nas últimas semanas, dizem economistas. Segundo eles, isso ocorre porque EUA e Europa estão subindo os juros contra a inflação e por causa do risco de a guerra na Ucrânia afetar o fornecimento de energia a países do continente europeu. E essa situação toda vai respingar no Brasil.
A retração econômica nas maiores economias do mundo deve ocorrer entre o fim deste ano e o primeiro semestre de 2023, apontam economistas, atingindo as exportações brasileiras.
Por enquanto, o risco é de uma recessão maior na Europa que nos Estados Unidos, de duração curta —de dois a três trimestres. Se for isso, a economia do Brasil sofrerá uma desaceleração, mas sem recessão, diz o economista Rogério Studart, sênior fellow do Núcleo de Economia Política do Cebri (Centro Brasileiro de Relações Internacionais), ex-diretor executivo do Banco Mundial e do Banco Interamericano de Desenvolvimento.
Mas se a recessão nos Estados Unidos e, principalmente na Europa, for mais grave, cresce o risco de a China também ser atingida. Nesse caso, o Brasil pode entrar em recessão.
Temos uma recessão encomendada para o ano que vem. A guerra na Ucrânia agravou os gargalos na economia mundial, atingindo agora insumos básicos, como energia, e provocando inflação ainda mais forte. Na falta de ações coordenadas de políticas econômicas, um problema que vem desde a pandemia, foi colocado sobre os ombros dos bancos centrais a missão de reduzir inflação, elevando juros.
Rogério Studart
Recessão técnica e recessão de fato
Recessão técnica ocorre quando o PIB de um país apresenta variação negativa por dois trimestres seguidos. A recessão de fato ocorre quando há uma piora dos principais indicadores econômicos de um país, como desemprego, renda da população, receitas das empresa, investimentos.
Três motivos principais para recessão
1) Juros: Taxas altas esfriam a economia porque desestimulam o consumo, encarecem o crédito e dificultam projetos de crescimento para as empresas. Pela primeira vez desde 2018, o Federal Reserve (Fed, banco central dos Estados Unidos) começou a elevar os juros e, na semana passada, acelerou essa alta. A medida serve para retomar o controle da inflação recorde de 8,6%.
Simulações do Fed apontam para um risco de 50% de a alta dos juros levar o país à recessão. A projeção é compartilhada por bancos americanos, como o Bank of America, Goldman Sachs e Dreyfus and Mellon.
O Bank of England (BOE, banco central da Inglaterra) também já subiu os juros no Reino Unido para o maior patamar desde 2009. E o Banco Central Europeu (BCE) ainda não começou a elevar as taxas, mas avisou que o processo começa em julho, podendo inclusive ser acelerado em setembro.
2) Crise de energia na Europa: A guerra na Ucrânia ameaça o suprimento de energia para a Europa. A Rússia é o principal exportador e segundo maior produtor de gás natural do mundo, sendo responsável por fatias relevantes dessa fonte de energia para grandes economias, como a de Alemanha (49%), Itália (46%) e França (24%).
A Rússia já começou a cortar a oferta de energia aos clientes europeus. Isso significa restrições à produção nas indústrias e ao consumo das famílias, afirma o economista Paulo Dutra, coordenador do curso de Economia na FAAP, professor de economia internacional e especialista em comércio internacional.
O risco de recessão está no radar, e não é pequeno, em especial para a Europa, onde a possibilidade é mais elevada em duração e intensidade. O preço maior e a menor oferta de energia afetam o consumo e a produção na economia, o que reduz a atividade.
Paulo Dutra, coordenador do curso de Economia na FAAP
3) Covid na China: Tem havido aumento no número de casos de covid-19 na China, que tem adotado medidas de restrição em cidades importantes, gerando desaceleração da economia.
O cenário de aperto nas políticas monetárias [aumento de juros] nos países desenvolvidos e desaceleração da atividade na China aumentou a probabilidade de que a economia global entre em recessão.
José Márcio Camargo, economista chefe da Genial Investimentos
Impacto maior na Europa que nos EUA
Economistas dizem que a recessão deve ser mais forte e longa na Europa porque os países da região sofrerão dois impactos simultâneos —o dos juros e o da energia.
A elevação dos juros pelos bancos centrais de Estados Unidos, União Europeia e Inglaterra deve levar a uma desaceleração sincronizada global, diz o economista Adauto Lima, economista-chefe da unidade brasileira da Western Asset, gestora global que administra US$ 449 bilhões em investimentos.
Os riscos de recessão são maiores na Europa por causa do choque energético mais severo no continente que nos Estados Unidos, que são autossuficientes em energia.
Adauto Lima
Além da menor exposição ao choque de energia, a economia norte-americana entra no ciclo de aumento de juros mais saudável que a da Europa. O PIB dos Estados Unidos recuou menos que o da zona do euro em 2020 e cresceu mais em 2021.
Variação do PIB nos anos da pandemia
- EUA: -3,4% em 2020 e +5,7% em 2021
- União Europeia: -6,3% em 2020 e +5,4% em 2021
- China: +2,2% em 2020 e + 8,1% em 2021
- Brasil: -4,1% em 2020 e +4,6% em 2021
O Fed tem que conter a demanda em um momento em que as famílias americanas ainda têm reservas, acumuladas nos últimos anos, para consumir, e vinham se endividando, para comprar imóveis, por exemplo. Com os juros subindo, haverá uma recessão, mas não deve ser um tombo.
Rogério Studart
Impacto no Brasil
O impacto da recessão nas economias americana e europeia sobre países emergentes, como o Brasil, deve ser leve, caso se confirme essa expectativa de desaceleração rápida nos Estados Unidos, afirmam economistas ouvidos pelo UOL.
É provável que a recessão aqui, se ocorrer, seja menor que nos países desenvolvidos, até porque já tivemos uma forte desaceleração no ano passado. Como já atravessamos um período de grande desaceleração, sentiremos menos os efeitos desse cenário internacional.
Pedro Raffy Vartanian, professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie
Por enquanto, as projeções feitas por economistas para o Boletim Focus, do Banco Central, aponta crescimento para o PIB brasileiro: de 1,2% neste ano e de 0,76% em 2023.
Queda de exportações
O Brasil seria afetado pela recessão nos países ricos por causa das exportações. Elas responderam no primeiro trimestre deste ano por cerca de 19% do PIB.
Se os países que mais compram do Brasil entram em recessão, ou os exportadores brasileiros vendem menos, ou os produtos caem de preço.
Países que mais compraram do Brasil em 2021
- China: US$ 87,7 bilhões (31,28%)
- EUA: US$ 31,1 bilhões (11,1%)
- Argentina: US$ 11,9 bilhões (4,2%)
- Holanda: US$ 9,3 bilhões (3,3%)
- Chile: US$ 6,9 bilhões (2,5%)
- Singapura: US$ 5,9 bilhões (2,1%)
- México: US$ 5,6 bilhões (1,9%)
- Coreia do Sul: US$ 5,5 bilhões (1,9%)
- Japão: US$ 5,5 bilhões (1,9%)
- Espanha: US$ 5,4 bilhões (1,9%)
Fonte: Secretaria de Comércio Exterior do Ministério da Economia
Perigo maior para Brasil vem da China
O Brasil pode sofrer um tombo maior com uma recessão global se a crise econômica atingir com mais força a China, maior importadora dos produtos brasileiros.
Uma desaceleração mais forte lá vai afetar de forma imediata nosso setor primário, mas depois o restante da população vai sofrer também porque vai circular menos dinheiro na economia com menos exportações.
Paulo Dutra, coordenador do curso de Economia na FAAP
Se a recessão nos Estados Unidos e na Europa afetarem a demanda pelas exportações chinesas no momento em que o país ainda convive com medidas de lockdown, o gigante asiático também passa a comprar menos de seus fornecedores. Uma possibilidade que já tem provocado variações de preços em matérias-primas, como minérios e grãos.
Nos últimos anos, o crescimento da China ajudou emergentes exportadores de commodities a atravessar períodos de recessão. Mas hoje a força da economia chinesa é menor, com taxas de crescimento menores. Consequentemente, uma desaceleração mais forte nos países mais ricos tende a afetar mais os países emergentes, como o Brasil.
Adauto Lima
Economia do mundo está parando, e Brasil corre sério risco de piorar também - UOL Economia
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